Galatéa
- Marco Villarta

- 3 de jun. de 2022
- 1 min de leitura
Hoje percebo que esculpo seu rosto (sim, só posso usar o tempo presente) Em cada ato, em cada lembrança E o mundo vai se tornando você Vai me transformando, de ilusório artífice A matéria bruta que vai tomando contornos Que vai se suavizando em linhas Que vai recebendo uma centelha Num âmago que antes não havia Numa vida que nem sequer florescia Me apaixono por sua face que me constrói Pela minha própria face que passa a ver Que a Arte não é mera técnica É esse campo de entremeios São os interstícios, as não visíveis fendas As invisíveis rachaduras na superfície Seja das faces, seja dos sulcos da alma Dos confins de tempos de vidas outras De outras histórias, das nossas próprias Meus olhos, recém criados Só podem ver o mundo que me foi dado Porque se embebem da luz que você lhes confere E, na sua ausência, no seu esvair-se Ainda enxergo. Meus olhos não cerraram Eles aprenderam a ver para além Pela necessária distância que as faces exigem Para se contemplarem. Com infinita devoção Com o respeito sagrado de quem, Mais que artista, sabe de si que foi criado E essa mútua obra de arte, da matéria da vida Faz o tempo ser sem causa, sem sequência Mistério tecido, texto de afeto Sintaxe divina.
Marco Villarta Lavras, 17 de novembro de 2021.




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