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Centrífuga


Alçar-se às alturas Saber da profundidade dos abismos Suportar a monótona planura Dos desertos, das savanas Estéreis terrenos do existir Perder o fôlego na queda sem fim Do poço que atravessa dimensões Hei de encontrar um físico amigo meu Meio Merlin, meio Hudini Que, sussurrando bem baixinho, Me conte de algum buraco de minhoca Quem sabe um poeta doido Ou amalucado crítico da literatura Que me conte onde Borges viu o Aleph Ou Drummond vislumbrou a máquina do mundo Quem sabe eu restaure a volúpia do viver E, pela primeira vez, qual o bebê que todos fomos Eu creia na necessidade de não interrogar os mistérios Há esfinges que só devoram quando perguntamos Não sei da estação, nem do destino impresso no bilhete Sei dos túneis, inevitavelmente escuros Sei das curvas nas montanhas E da beleza de olhar mais para a curva dos vagões Serpenteando, ladeando as escarpas, Do que para a paisagem, mesmo do que o caminhar Por fim, esmaeço e sinto desaparecer Os contornos do corpo e as agruras da alma Me evaporo, me desintegro Sou outra vez o que fui, o que fomos Pirlimpimpim de cintilantes estrelas Que pena... elas já não são Mas como somos lentos no olhar E um tanto confusos no agir Ainda olho pro céu E penso ver o que já não é O ato presente, de conhecer Nos prega peças, eu sei, já soubemos Permite olhar sei lá que tantos passados E não se lembrar não estar em nenhum Somos átomo fora da curva Turvas águas do rio imortal Não porque os deuses sintam inveja Só não querem dividir conosco Tão amarga condição.


Marco Villarta São José dos Campos, 30 de agosto de 2021.

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Marco Villarta

Professor universitário, pesquisador, poeta, ensaísta, escritor, tradutor. Doutor em Letras. Nascido em São José dos Campos/SP - Brasil. Curioso pela vida e pelas pessoas, pela arte e pelos sonhos.

Membro correspondente da Academia Jacarehyense de Letras

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