Fazer (ao) dizer

Que distância há entre o dizer e o fazer? Parece que há um abismo óbvio entre as duas, seja na dificuldade de cumprirmos promessas, seja nas mentiras. Ouso contrariar essa obviedade. E nem serei técnico para argumentar que dizer também é fazer algo. Quando alguém se sente mal por receber uma notícia impactante ou por receber tratamento agressivo (ou, ao contrário, grande manifestação de afeto), podemos nos dar conta que as palavras ditas representam um gesto, um ato que alguém praticou. Pedir uma informação é assumir publicamente um desconhecimento, enquanto dar a informação corresponde a uma atitude de generosidade ou de malícia (dependendo de a informação ser verdadeira ou falsa). Estabelecemos compromissos perante a lei ou nos responsabilizamos perante outra pessoa quando fazemos juras de amor, situação cujo ápice são as cerimônias de casamento. Outro exemplo cotidiano. Perguntar. Se estamos em uma roda de amigos e nos mantemos em silêncio, isso pode ser considerado aceitável. Mas se alguém nos pergunta algo e nos calamos, o efeito dessa atitude (de recusar-se a dizer) pode ser devastador. Pode abalar um relacionamento ou pode até ser considerado uma confissão de culpa, dependendo da natureza da pergunta. E mais ainda. Como qualquer ato, os sentidos dele dependem da situação em que é praticado. Repetir uma palavra de uma criança que está aprendendo a falar é acolhedor e gracioso, mas pode ser ofensivo imitar o sotaque de alguém que não fala inteiramente nossa língua ou nosso dialeto regional. O que estou fazendo aqui neste texto não é diferente: argumentando em favor de um conceito. E tudo isso reveste-se de algo igualmente importante. Para o bem ou para o mal, sempre, em qualquer situação, fazemos juntos. A presença ou a ausência física já representam isso. E com a palavra (presente ou ausente) não é diferente.

Marco Villarta

Professor e pesquisador na Universidade Federal de Lavras. Poeta, escritor e tradutor. Membro Correspondente da Academia Jacarehyense de Letras.